terça-feira, 12 de julho de 2011

Violência: Ueslei Oliveira, o milésimo morto, completaria 24 anos amanhã

O CORREIO mostra que o milésimo morto do ano, Ueslei Oliveira - assim como os outros 999 - tem uma história de vida.


A escola que ele abandonou, o emprego na construção civil que lhe daria chance de, tijolo sobre tijolo, reerguer a vida. As companhias mal escolhidas, o destino traçado com linhas tortas. Tudo isso deve ter passado pela cabeça de Ueslei, 23 anos, quando ele encarou aquela arma apontada para sua cabeça na manhã de domingo. Mas era tarde demais.
Vários tiros depois, Ueslei Morais de Oliveira seria apenas mais um nome para a lista de mortos da polícia baiana. Seria, não fosse ele o milésimo morto este ano, de acordo com relatório nominal que a Secretaria da Segurança Pública (SSP) disponibiliza na internet desde  17 de janeiro.

A coincidência faz com que a vida de Ueslei esteja nestas páginas e, assim, dê forma a tantas outras histórias de vida, com caminhos semelhantes e igual destino, que se perderam - e se perderão - no meio dessa relação.

Maria de Lourdes, mãe de Ueslei, se apoia na fé para enfrentar a perda do filho
No dia do crime, ele saiu de casa de manhã, por volta das 9h, dizendo que ia visitar a namorada. “Ele não me encontrou em casa e seguiu”, contou a garota, uma das tantas com quem Ueslei se relacionava e que não quis se identificar. Na 1ª Travessa Luciano Gomes, no Alto da Cebola, a cerca de 500 metros de onde morava, ele foi morto.
O corpo de Ueslei foi enterrado ontem à tarde, no Cemitério da Quinta dos Lázaros, na Baixa de Quintas. Alguns vizinhos comentaram que o rapaz usava drogas e há algum tempo passou a andar em “más companhias”. Em 2005, de acordo com a polícia, ele teve passagem pela 11ª Delegacia, em Tancredo Neves, por porte ilegal de arma.

Além disso, entre as poucas palavras, só se sabe que há rixas entre diversas localidades de Pau da Lima e que Ueslei já havia se mudado da casa da mãe por conta de problemas com moradores do bairro. Tinha voltado há pouco tempo - e já estaria marcado de morte.

O irmão, Everton, porém, afirmou que o rapaz morreu por “inveja”. “Era um cara bonito. Tinha muitas namoradas”, desconversou. Uma dessas namoradas está grávida de 8 meses. Não dele. “Mas ele assumiu e até deu o nome da menina. Vou manter o que ele escolheu em homenagem”, comentou Érica Santos.

Dificuldades  Ueslei morava na localidade de Tabela, em Pau da Lima, com mais três irmãos e a mãe. Na casa, não há quarto, cozinha ou sala. Tudo se confunde em dois ambientes. A TV divide espaço com a geladeira; o fogão, com a cama. Apesar das visíveis dificuldades financeiras, a dona de casa Maria de Lourdes, mãe de Ueslei, se apoia na fé: trechos da Bíblia estampam as paredes e o portão da casa.
Ao falar do filho, a tristeza pela morte dá lugar à resignação. “Era um bom menino. Não tinha maldade”, comentou, ontem de manhã, enquanto juntava os documentos de Ueslei. Foi também na fé que ela procurou forças para enfrentar a perda do filho. “Eu tenho Deus no coração. Se não tivesse, estaria desesperada”, afirmou.

Aniversário O rapaz faria aniversário amanhã. Ontem, teria começado a ajudar o tio em uma obra em  Castelo Branco. Já estava tudo combinado. “Ele trabalhou comigo como ajudante de pedreiro numa obra no ano passado, na Pituba, e começaríamos hoje de novo. Ele tinha bom coração”, lembrou. 

Quem matou Ueslei, ninguém sabe. Mãe, tio, irmão, namoradas, pai... ninguém desconfia. Quem viu ele nascer e crescer tenta se conformar. “Tava andando com gente errada. Eu não entendo isso. Agora só posso lamentar”, diz o pai, Valdemir Isidoro de Oliveira, 62 anos, separado da mãe há cerca de dez anos.

LEMBRANÇAS Apesar dos lamentos da família com as recentes influências que Ueslei recebia, um amigo lembra que o rapaz, sempre popular, era tranquilo na adolescência e frequentemente batia baba no bairro, além, é claro, de namorar bastante  - “até começar a andar com um pessoal estranho”.  Depois de muitas idas e vindas, Ueslei estava matriculado na Escola Estadual Rogério Rego, no turno da noite, e, se continuasse frequentando as aulas, terminaria o ensino médio em 2012.

Mas, segundo funcionários, desde o começo do ano já não aparecia por lá. A escola está localizada em Jardim Cajazeiras - uma das localidades que têm rixa com Tabela, onde o rapaz morava. Ueslei e Laira Beatriz - o nome que ele escolheu para a filha - não vão se conhecer. Isso também deve ter passado pela cabeça dele ao ver aquela arma.

O assassinato de Ueslei está sendo investigado pela delegada Laura Argolo, do Departamento de Homicídios e Proteção  à Pessoa (DHPP). Ela não foi encontrada para comentar o caso. De acordo com a assessoria de comunicação da Polícia Civil, a delegada passou todo o dia em reunião. 
No domingo, a plantonista que acompanhou o caso, Rita de Cássia, informou que Ueslei havia sido encontrado com várias perfurações de bala na cabeça, na mão e na axila esquerda, mas as hipóteses sobre a autoria e a motivação do crime só poderiam ser investigadas pela delegada que fosse assumir o caso.  

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