terça-feira, 31 de maio de 2011

Conflito entre traficantes de duas ruas do Centro Histórico transforma Pelourinho em campo de guerra

O assassinato do traficante Diogo Santos da Silva, 21 anos durante o ensaio do Olodum é reflexo de um conflito entre traficantes.

Pé de Bolo era o maior de todos na rua 3 de Maio, no Pelourinho. Ele era suspeito de matar Xota. Au não gostou - e mandou matá-lo. O assassinato do traficante Diogo Santos da Silva, 21 anos - o Pé de Bolo - durante o ensaio do Olodum, no Largo Pedro Archanjo, no domingo, é reflexo de um conflito entre traficantes que vem assustando o Centro Histórico.

O principal suspeito de matar Pé de Bolo, segundo policiais, é um traficante de prenome Willian, comparsa de Au, chefe do tráfico da rua do Gravatá, conhecida como Cracolândia, transversal da Baixa dos Sapateiros.

O crime, segundo o tenente-coronel José Jorge Nascimento, comandante da 18º (BTL) Polícia Militar, é resultado da rivalidade entre traficantes das duas ruas. “Eles disputam pontos de tráfico e o Pé de Bolo já devia estar marcado para morrer. Ele já tinha sido preso pelo menos três vezes por tráfico de drogas”, relata.

Crime
Segundo testemunhas, Willian chegou ao Largo Pedro Archanjo com duas mulheres. Dentro do espaço da apresentação da banda, onde havia cerca de 400 pessoas, o traficante deu uma gravata em Diogo e, em seguida, atirou várias vezes.

“Depois, ele largou o cara e atirou a esmo, atingindo outras pessoas. Todos começaram a correr com o barulho dos tiros, e o atirador ainda voltou para dar um confere enquanto o cara agonizava. Aí, deu um tiro na cabeça”, contou um segurança, que não quis se identificar. Em seguida, fugiu. “Ele pulou o muro e caiu sobre um Celta na rua das Laranjeiras”, lembra.

Rita Dorotéia, 52 anos, dona do bar Marrom Marfim, que funciona dentro do Largo, lembra o pânico: “O povo pulava as grades. Só via gente correndo e quebrando um monte de coisas. Tive um prejuízo de R$ 600 entre contas não pagas e equipamentos quebrados. Nunca vi isso. Entramos em pânico”, diz.

Após o crime, a mulher de Diogo, de prenome Katiúscia, foi levada para a Delegacia de Proteção ao Turista (Deltur) junto com Suelen, apontada como comparsa de Willian.

Além de Diogo, três mulheres e uma menina de 11 anos foram baleadas. Rosemeire Sena  Santos, 45, Cristiane Alves Conceição, 32, e Jaiane Santos de Araújo, 11, foram socorridas ao HGE.  De acordo com a Secretaria da Saúde estadual (Sesab), Rosemeire e Cristiane já receberam alta. A garota, baleada no pé, continua em observação. Não há informação sobre a terceira mulher baleada.

Gangues
A rua 3 de Maio é apontada pela Associação dos Comerciantes do Centro Histórico (Acopelô) como rota de fuga para bandidos que agem na região. A área, segundo um investigador, era liderada por Pé de Bolo.

Do outro lado, na rua do Gravatá, o tráfico é liderado pelo traficante de prenome Árison, conhecido como Au.

De acordo com o delegado Marcelo Tanus, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), o autor do disparo está sendo procurado. “Nossa principal linha de investigação está relacionada à briga entre gangues rivais. A vítima era traficante de drogas e atuava no Centro Histórico, mas já tinha diversas passagens pela polícia”, diz.

Willian, acusado de matar Pé de Bolo, é um dos braços do traficante. Além dele, uma mulher de prenome Suelen e outra vulgo Capixaba reforçam o bando.
 “Há informações de que Willian matou Diogo por achar que ele ia cometer um atentado contra Au. Além disso, um traficante vulgo Xota, que era segurança de Au, foi morto pelo bando de Pé de Bolo”, conta um policial.

Os nomes listados são apenas a “ponta de um iceberg”. “Existem outros nomes, mas não podemos revelar. Esses são os que mais aparecem. O que aconteceu é uma represália aliada ao desejo de dominar os pontos de tráfico de drogas”, diz o agente.

Um guardador de carros, que não quer ser identificado, diz que a violência está aumentando: “Nunca chegou nesse ponto, apesar de a rixa ser antiga. O que morreu era uma das cabeças mais caras na disputa”, afirma.

Em entrevista coletiva ontem, o presidente do Olodum, João Jorge, lamentou o crime. “Lamento o ocorrido. O problema da segurança é mundial, mas nunca aconteceu um crime em nossos ensaios”, disse.

Comerciantes reclamam da violência
O presidente da Associação dos Comerciantes do Centro Histórico (Acopelô), Lenner Cunha, afirmou que nos últimos seis anos 47 estabelecimentos comerciais já fecharam as portas no Pelourinho. “Deram as costas para o Pelô. Por causa da falta de segurança, só contabilizamos prejuízos”, diz. Em fevereiro, ele encaminhou ao secretário da Segurança Pública, Maurício Barbosa, uma lista com os pontos mais críticos da região – entre eles a rua 3 de Maio. “Quando acontecem os delitos, os bandidos correm sempre para os mesmos lugares”.

Falha na segurança
O acesso ao show do Olodum, no Largo Pedro Archanjo, na noite de anteontem, só era permitido após revista. “Eu estava com a máquina fotográfica e os seguranças pediram pra ver o que tinha dentro. Não entendo como aquela arma entrou”, diz uma amiga da mulher de Diogo. Segundo uma fonte ligada à segurança, o autor dos disparos entrou pela porta principal, acompanhado por duas mulheres. Em nota, a direção do Olodum informou que o autor dos disparos driblou o acesso pela portaria, que é protegida por vigilantes de uma empresa especializada contratada em todos os eventos.

A direção do Olodum disse ainda que foi aberta uma sindicância para apurar melhor as circunstâncias do crime. “A equipe de segurança colaborou com o trabalho da PM, fornecendo informações sobre o fato, bem como se colocou à disposição da polícia para outros esclarecimentos. Infelizmente, fatos como estes são cada vez mais crescentes nas cidades brasileiras e a cidade de Salvador não está livre deste processo de violência”, diz um trecho da nota.

Por telefone, a secretaria da empresa MF Segurança informou que os funcionários cuidam apenas do patrimônio e que os organizadores do evento são responsáveis por garantir a segurança das pessoas. A assessoria do Programa Pelourinho Cultural, órgão do Instituto do Patrimônio Artístico Cultural, vinculado à Secretaria de Cultura, informou que o show de Armandinho agendado para ontem à noite foi cancelado devido à fatalidade.

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